Acumulação compulsiva de objetos ou episódios de descontrole comportamental
em adolescentes são exemplos de sintomas de novos transtornos
mentais.
Da BBC Mesmo em luto, pacientes receberão diagnóstico de
depressão após apenas duas semanas (Foto: PA/BBC)
Diversas atitudes e sentimentos até agora considerados normais passarão a ser
classificados como doença mental pela nova edição do Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental
Disorders, ou DSM-5, na sigla em inglês), conhecido como a "Bíblia da
psiquiatria", que será lançada neste fim de semana pela Associação Americana de
Psiquiatria (American Psychiatric Association, ou APA, na sigla em
inglês).
Usados por médicos do mundo todo, inclusive do Brasil, o DSM traz uma lista
de sintomas relacionado a cada doença e estabelece quantos são necessários para
que um paciente seja diagnosticado com determinado transtorno
mental.
Segundo críticos, a nova edição reduz o número de sintomas para o diagnóstico
de alguns transtornos, além de ampliar o número de doenças, o que aumentaria os
diagnósticos e, consequentemente, o uso de medicamentos e o mercado para a
indústria farmacêutica.
Enquanto algumas alterações no manual - que está em sua quinta edição, a
primeira desde 1994 - têm sido recebidas de maneira positiva, ou pelo menos
indiferente, muitas vêm provocando críticas e discussões
exaltadas.
Uma das mudanças mais polêmicas está relacionada ao diagnóstico de depressão.
Na edição anterior do DSM, pacientes que estavam em luto eram excluídos do
diagnóstico, mesmo que apresentassem os sintomas, a não ser que o comportamento
persistisse por mais de dois meses. Agora, após duas semanas, mesmo em luto, o
paciente poderá receber diagnóstico de depressão.
Outra alteração controversa diz respeito aos critérios para o diagnóstico de
Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade.
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O número de sintomas permanece o mesmo. São 18, divididos em dois grupos -
falta de atenção e hiperatividade/impulsividade -, e é preciso apresentar pelo
menos seis sintomas em um dos grupos para receber o diagnóstico. No entanto, a
idade para o surgimento dos sintomas, que era de até sete anos, passou a ser de
até 12.
No caso da Síndrome de Asperger, a crítica é pelo fato de a doença ter sido
transformada em um subtipo de autismo, incluída em uma nova categoria chamada de
Transtorno do Espectro Autista.
Ao longo de sua trajetória, o DSM já foi alvo de muitas polêmicas. Até a
década de 1970, por exemplo, o manual classificava a homossexualidade como
doença.
Veja abaixo algumas das novas doenças classificadas pelo
DSM-5:
Compulsão alimentar
O Transtorno da Compulsão
Alimentar Periódica, no qual a pessoa devora quantidades excessivas de comida
descontroladamente e em um período delimitado, de até duas horas, passará a ser
considerado uma doença mental. Pessoas que registrarem esse tipo de
comportamento pelo menos uma vez por semana durante três meses poderão ser
diagnosticadas com a doença.
A compulsão alimentar já aparecia no apêndice da edição anterior do DSM, o
que indicava a necessidade de pesquisas adicionais antes de definir o problema
como uma doença. Segundo a Associação Americana de Psiquiatria, após extensas
pesquisas, os resultados sustentam "a validade e a utilidade clínica" de definir
o transtorno como uma nova doença.
Distúrbio de Hoarding
A acumulação compulsiva - e a
incapacidade de se desfazer - de objetos, inclusive lixo, conhecida como
"hoarding" em inglês, era até agora considerada um sintoma do Transtorno
Obsessivo Compulsivo (TOC).
A nova edição do DSM define esse tipo de comportamento como uma doença
separada, caracterizada pela "dificuldade persistente de se desfazer ou se
separar de suas posses, independentemente de seu valor real".
Provocar escoriação da pele
Esse transtorno, chamado de
"skin-picking" em inglês, consiste em cutucar a pele constantemente, o que
resulta em ferimentos. A nova doença foi incluída no capítulo sobre transtornos
obsessivos-compulsivos e doenças relacionadas.
Transtorno Disfórico Pré-Menstrual
Considerado uma forma
mais grave de TPM (Tensão Pré-Menstrual), o Transtorno Disfórico Pré-Menstrual
figurava no apêndice da edição anterior do DSM, indicando a necessidade de mais
pesquisas sobre o tema. No DSM-5, é classificado como uma doença mental, com
base em "sólidas evidências científicas", segundo a Associação Americana de
Psiquiatria.
Os sintomas da doença incluem tensão, alterações de humor, irritabilidade,
ansiedade, raiva, tristeza, letargia, mudanças no apetite e insônia, entre
outros, manifestados nas duas últimas semanas do ciclo menstrual, durante a
maioria dos ciclos menstruais do último ano.
Transtorno disruptivo de desregulação do humor
Crianças
ou adolescentes de até 18 anos de idade que apresentam 'irritabilidade
persistente e episódios frequentes de extremo descontrole comportamental' em um
período de pelo menos três vezes por semana, ao longo de um ano, poderão ser
diagnosticadas com esta nova doença.
A Associação Americana de Psiquiatria diz que decidiu incluir o novo
diagnóstico no DSM-5 em resposta aos temores sobre a possibilidade de um excesso
de diagnósticos e tratamento de transtorno bipolar em crianças - é cada vez
maior o número de crianças diagnosticadas com transtorno bipolar nos
EUA.
A criação desse novo diagnóstico alternativo teria o objetivo de evitar esse
número crescente de crianças sendo medicadas para transtorno bipolar, às vezes
com base em um diagnóstico errado. No entanto, a decisão vem cercada de muita
polêmica.
"Meu temor é que crianças normais com ataques de birra sejam diagnosticadas
equivocadamente e recebam medicação inapropriada", diz o psiquiatra Allen
Frances, que comandou a força-tarefa responsável pela quarta edição do
DSM.
Professor emérito da Universidade de Duke, na Carolina do Norte, Frances é um
dos maiores críticos do DSM-5. "O DSM-5 corre o risco de tornar uma situação que
já é ruim muito pior", escreveu Frances em seu blog no portal de notícias "The
Huffington Post".