Como tinha um intervalo grande na agenda, aproveitei para
fazer algumas coisas em um shopping perto do meu consultório. Estando lá, me
sentei em um café com o meu livro, como costumo fazer. Na mesa ao lado, sentaram
três jovens, sendo que dois
estavam muito indignados com o final de ano. Aproveitei que veio o café, fechei
o livro e fiquei ouvindo os ”papos”, pois falavam num tom de voz alto, sem
terem a preocupação de quem estava na volta a escutar.
A indignação de um se dava pelo fato de ter que gastar com presente de
Natal. Dizia que seus pais o obrigavam comprar presente para todo mundo,
alegando que ele trabalhava e que tinha que aprender a mostrar o seu afeto para
com as pessoas. Isso o incomodava, pois não concordava com essa forma de pensar
dos pais, até porque, estão sempre sem “grana” e ainda tem que gastar para
mostrar afeto. Percebia-se o seu inconformismo e indignação.
O outro se julgando mais esperto e não recebendo essa pressão da família,
disse que na casa dele não tinha isso, quem quisesse dar presente dava. Conta
para os amigos que em novembro costuma brigar com a namorada para não gastar com
presente, afinal, trabalha para pagar suas festas e a prestação do carro. Segundo
ele, não se estressa com a história de dar presente, mas acredita que seus pais
é que têm que lhe presentear.
Enquanto esses dois expunham seus sentimentos, o terceiro rapaz ouvia
atentamente a fala dos amigos e disse que não via motivo para se estressarem,
afinal, Natal é uma festa que acontece uma vez por ano para comerem comida boa
e Reveillon é aquela festa que todo mundo “enche a cara e no dia seguinte curte
uma ressaca na boa”.
Não preciso dizer que eu estava quase enfartando com o ”papo” dos garotos.
Enquanto escutava a fala dos mesmos, pensava o que os seus genitores
transmitiram para os seus filhos. Se fossemos analisar cada um deles, o quadro
seria crítico. Perguntar-lhes o que se comemora no Natal, seria algo temerário,
pois as respostas provavelmente seriam um tanto absurdas.
No entanto, tinha que concordar com a indignação do primeiro rapaz, afinal,
não podemos vincular demonstração de afeto a dar presente, principalmente
quando a “grana” está curta. Até pode ser uma das formas de expressar o afeto,
mas não é a única.
Já o segundo pela sua fala demonstrava ser um garoto mais narcísico, que
ainda acredita que o mundo gira em torno dele e que não tem compromisso com
nada, a não ser com ele. E o terceiro parecia uma pessoa completamente
alienada.
Confesso que na medida em que os escutava, me entristecia, pois
demonstravam o quanto são pobres de cultura, de sentimentos, de valores, de
crítica, etc. O pior é que isso não é um pensamento só desses jovens, se
investigarmos junto às pessoas, elas também estão preocupadas em comprar
presentes, reclamam do que vão gastar a mais na ceia de Natal, comentam a
chatice das festas de final de ano e por ai vão. Esquecem o verdadeiro
significado do Natal e aí fica o meu questionamento, até quando continuaremos
vivendo um Natal de comércio? Será que, em algum momento, essa cultura que se
instalou em nossa sociedade mudará? Provavelmente, se depender dos três jovens
que conversavam na mesa ao lado da minha, com certeza não haverá mudança. Isso
é lamentável!