Hoje resolvi escrever
sobre algo que está me incomodando já faz algum tempo, pois vejo que nos dias
atuais, nós adultos, temos a necessidade de enquadrar os adolescentes dentro de
uma patologia.
Aquilo que até pouco tempo era visto como natural dessa
fase de desenvolvimento, hoje passa a ser patológico. Recebo adolescentes que
são encaminhados pelas escolas, já com o diagnóstico de hiperatividade. Fico
com a sensação de que a hiperatividade passou a ser percebida como algo
epidêmico e penso que se continuarmos trilhando esse caminho, quando a criança
for matriculada na escola, além do atestado de matrícula, num futuro próximo,
sairá com o encaminhamento para o psicólogo com o diagnóstico de
hiperatividade.
Temos que ter claro que a adolescência é uma fase de
muitos conflitos, pois o jovem está vivendo o luto da perda dos pais infantis,
do corpo infantil e isso lhe gera um conflito imenso, porque teme perder o amor
desses pais. Assim como, os pais também têm dificuldade de entenderem que seus
filhos já não são mais aquelas crianças que o solicitavam a todo o momento, que
agora já começam a se tornarem independentes, abrindo espaço para que os pais
possam retomar suas vidas, mas sem deixar de ter um olhar para eles. Então,
trata-se de uma fase conflituada para os adolescentes e para os pais e isso
precisa ser compreendido.
Talvez as pessoas hoje desconheçam as características
dessa fase e por isso optam por enquadrá-los como jovens problemáticos. O
adolescente está em busca de si mesmo e da sua identidade, tem uma tendência
grupal, tem a necessidade de intelectualizar, portanto, questiona e fantasia,
chegando muitas vezes se perceber como o salvador do mundo, tendo ideias
revolucionárias. Pode tornar-se incrédulo ou muito fervoroso, em função das
crises religiosas que vive. Acredita que o tempo é elástico, em função da sua
deslocalização temporal, onde o pensamento pode adquirir características de um
pensamento primário. Manifesta uma evolução sexual, podendo transitar do
autoerotismo até a heterossexualidade genital adulta. Tem atitudes reivindicatórias
com tendências que podem ser percebidas como anti ou associais de diversas
intensidades, apresenta contradições sucessivas em sua conduta, onde a ação é
que domina, devido ser a forma de expressão que prevalece nessa fase da vida,
as flutuações de humor e do estado de ânimo são vista como algo normal.
Penso que devemos nos preocupar se tivermos adolescentes
centrados, quietos, que entram na sala de aula e não se mexem na cadeira e se
limitam a falar quando o professor o solicita. Adolescentes que ficam em casa e
participam do convívio familiar sem ter que ser solicitado, que se oferecem
para fazer as tarefas de casa, que não gostam de internet, de videogame, de
música, que não queiram burlar as regras, que não aprontem, que não se identifiquem
com a sua tribo, como gostam de falar. Porque isso é assintomático nessa fase
do desenvolvimento.
Tenho a sensação de que não queremos assumir que o prazo
de validade da nossa paciência, tolerância, flexibilidade está vencendo e por
isso, projetamos para eles as nossas frustrações, as nossas decepções, as
nossas neuroses, sem nos darmos conta que estamos estigmatizando esses
adolescentes e rotulando-os para o resto da vida.
É preocupante o número de jovens que está fazendo uso de
medicação e isso me leva a questionar se realmente é necessário ou será que não
está faltando à compreensão dinâmica do funcionamento desses jovens? Não nos
damos conta que ao medicarmos uma criança ou um adolescente estamos mostrando a
eles que a indústria farmacêutica criou uma fórmula mágica que resolve qualquer
problema, até mesmo quando esse é educação e limite, basta tomar um comprimidinho
e tudo está resolvido. Assim, vamos introjetando em seus inconscientes que o uso
de droga, porque a medicação é considerada uma droga, lhe aliviará os seus problemas
e convidando-os, quem sabe, amanhã ou depois, buscar outros tipos de droga que
os permitam ver a vida de forma mais colorida.
Penso que precisamos parar um pouco e pensarmos se temos
o direito de enquadrarmos nossos adolescentes em tantas patologias como estamos
fazendo. Será que ao fazermos isso não estamos dando vazão a nossa
perversidade?
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